quinta-feira, 11 de abril de 2013

A quem interessa que o Ministério Público não exerça poderes de investigação criminal?

A PEC nº 37 ou “PEC da Impunidade” como é conhecida para os críticos de sua redação, limita a busca da verdade e afronta direitos do cidadão.

De autoria do deputado Lourival Mendes (PTdoB-MA), a PEC da Impunidade acrescenta um parágrafo ao artigo 144 da Constituição Federal, para estabelecer que a apuração das infrações penais será competência privativa das polícias federal e civil. Atualmente, por determinação constitucional, o Ministério Público e outras instituições também exercem, em casos específicos, a atividade de investigação criminal.

Sem adentrar no mérito acerca da sua constitucionalidade, a proposta de Emenda Constitucional, caso aprovada, vai contribuir para a impunidade ao restringir o poder de investigação do Ministério Público, pois no cerne da discussão, não está a busca do melhor resguardo dos direitos do cidadão e da sociedade como um todo, mas sim disputas institucionais levadas a efeito por pessoas que não possuem interesse que o Ministério Público investigue, ou porque já foram alvo de investigação por esta instituição ou por representarem interesses de pessoas atingidas, de alguma forma, pela atuação ministerial.

O consultor jurídico da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), Emerson Garcia, em audiência pública realizada ainda neste ano, para discutir o texto da PEC 37, contestou as justificativas apresentadas pelo autor da matéria, Lourival Mendes, entre elas a de que as investigações realizadas pelo Ministério Público não são imparciais, visto que a própria instituição é a responsável pela acusação em juízo. "A PEC parte da premissa de que não haverá um comprometimento da imparcialidade da investigação, caso o Ministério Público a realize. O MP é uma instituição vocada à defesa da ordem jurídica, do regime democrático, dos interesses individuais e sociais indisponíveis e, por isso, é sempre imparcial. Ao receber ou realizar uma investigação, o Ministério Público vai sempre visar o que é justo", argumentou.

Ora, como salientado, argumentar que a atuação do Ministério Público, no exercício do poder investigatório criminal, seria mais parcial do que aquele realizado pela polícia judiciária, é desconhecer completamente o trabalho realizado pelos Promotores de Justiça nas mais diversas comarcas de todo o Brasil. Antes de exercer a acusação, o Ministério Público zela pelo respeito à ordem jurídica, inclusive, e isso não é exceção, na defesa dos interesses do próprio acusado dentro do processo criminal.

Então, a quem interessa que o Ministério Público não exerça qualquer papel na coleta de elementos probatório que irão instruir uma futura ação penal? Se o Ministério Público possui a atribuição constitucional de formular a Ação Penal Pública, soa ilógico esse mesmo órgão não exercer qualquer papel na investigação criminal.

Para Emerson Garcia, não só a atuação do MP será limitada, caso a PEC seja aprovada, como também a proposta poderá impedir as ações de órgãos administrativos - como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), o Banco Central e a Receita Federal - cujas investigações geralmente revelam práticas criminais. "O que se pretende com essa PEC é que os crimes não sejam elucidados".

O referido doutrinador concluiu, ainda, que, além de ser inconstitucional e prejudicial à sociedade, a PEC da Impunidade vai na contramão da evolução do sistema judicial brasileiro. "A tendência do Estado contemporâneo é convergir e não estabelecer nichos de exclusividade. Tanto isso é verdade que, no sistema constitucional brasileiro, o juiz sequer tem atribuição exclusiva para decidir uma lide. No caso do Ministério Público, se a instituição não ajuizar uma ação penal pública, um cidadão poderá ajuizar a ação penal privada, subsidiária da pública. Não há sentido, não há coerência sistêmica, atribuir a exclusividade da investigação à Polícia Judiciária".

Em razão da pouca representatividade do Ministério Público no Congresso Nacional, fruto de uma atuação imparcial e independente, desprovida de interesses políticos, ao longo das últimas décadas, este órgão vem sofrendo constantes e incansáveis ataques advindos de pessoas que, longe de entender a real finalidade do Ministério Público, e sua importância no cenário social, possuem interesses diretos no enfraquecimento desta instituição. Tais atitudes demonstram que alguns políticos brasileiros continuam pensando no interesse de poucos, em detrimento do interesse de toda população.

DIGA NÃO À IMPUNIDADE, DIGA NÃO À PEC Nº 37.

A 4ª Promotoria de Justiça desta Comarca, com atribuições para atuar na defesa da moralidade administrativa, ingressou com  Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa (n.  08.2013.00095030-2), tendo em vista a contratação irregular de profissionais da área de engenharia, por meio dos procedimentos licitatórios Convites n. 94/2008, 8/2009 e 7/2010, cujo objeto era a elaboração de  projeto de pavimentação asfáltica e drenagem pluvial, em ruas e estradas do Município. No entender do Ministério Público, a contratação foi irregular, pois a Prefeitura de Concórdia  possui, em seu quadro de servidores permanentes, vários Engenheiros, em diversas áreas, havendo previsão legal para 12 (doze) profissionais lotados no Poder Executivo, e mais 2 (dois) na FUMDEMA – Fundação Municipal de Defesa do Meio Ambiente, conforme Lei Complementar Municipal n. 57/2010. Somados os três contratos, a municipalidade desembolsou o equivalente a R$ 205.565,20 (duzentos e cinco mil, quinhentos e sessenta e cinco reais e vinte centavos) em serviços de engenharia que poderiam ter sido prestados pelos próprios servidores de seu quadro. O pedido do Ministério Público consiste na condenação dos responsáveis por infração ao disposto pelo artigo 10, caput, da Lei de Improbidade Administrativa, às sanções do artigo 12, inciso II, da Lei n. 8.429/92, correspondente ao ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio dos réus, se concorrer esta circunstância; perda da função pública; suspensão dos direitos políticos de 5 (cinco) a 8 (oito) anos; pagamento de multa civil de até 2 (duas) vezes o valor do dano; e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos.

 A 4ª Promotoria de Justiça também ingressou com Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa (n. 08.2012.00586567-3) visando a anulação do Processo Licitatório n. 014/2010, realizado sob a modalidade de Pregão Presencial e regulada pelo Edital n. 11/2010, com a consequente anulação do Contrato Administrativo n. 106/2010 (intitulado "Minuta de Contrato n. 106/2010"), celebrado entre a empresa ré MACROMAQ Equipamentos Ltda e a Administração Pública Municipal de Irani-SC, representada pela ex-Chefe do Executivo, e também outros responsáveis pela contratação ilegal, requerendo, especialmente, o ressarcimento integral do dano, calculado em R$ 465.000,00 (quatrocentos e sessenta e cinco mil reais), sem prejuízo da aplicação das demais penalidades. Segundo apurado no inquérito civil n.  06.2010.00004005-6, a Prefeitura de Irani, em 9.3.2010, solicitou a aquisição de uma Escavadeira Hidráulica nova, realizando a descrição pormenorizada, com todas as especificações possíveis, do bem a ser adquirido, em afronta ao determinado nos artigos 3º, caput, e 15, §7º, inciso I, ambos da Lei 8666/93. A Ação também foi fundamentada no parecer emitido pelo TCE do Estado de Santa Catarina, que condenou a então Prefeita e o ex-Secretário Municipal de Transportes, Obras e Serviços do Município de Irani ao pagamento de multa no valor correspondente a R$ 800,00 (oitocentos reais), em decorrência das especificações do objeto da licitação descrita no Anexo D do Edital 11/2010, em afronta ao disposto no § 5º do artigo 7º, c/c § 1º do artigo 3º, todos da Lei n. 8.66/93. No entender do Ministério Público, a Prefeitura de Irani não deveria ter especificado de maneira extremamente detalhada o objeto a ser licitado, o que configurou possível direcionamento da Licitação e ofensa aos Princípios da Isonomia, Legalidade, Eficiência e da Livre Concorrência.
 
Promotora de Justiça Débora Pereira Nicolazzi